A KuCoin, uma das maiores exchanges de criptomoedas do mundo, apelou formalmente contra uma multa administrativa de C$19,6 milhões imposta pelo Centro de Análise de Transações e Relatórios Financeiros do Canadá (FINTRAC). A penalidade, a maior do tipo na história canadense, foi aplicada após o FINTRAC alegar que a entidade operadora da KuCoin não reportou quase 3.000 grandes transações em moeda virtual superiores a C$10.000, deixou de sinalizar 33 casos de atividade suspeita e não se registrou como uma Empresa Estrangeira de Serviços Monetários (FMSB) entre junho de 2021 e maio de 2024.
Em seu recurso apresentado ao Tribunal Federal do Canadá, a KuCoin contesta a caracterização feita pelo regulador sobre seu modelo de negócios. A exchange argumenta que não se enquadra na definição de empresa de serviços monetários conforme a legislação canadense e afirma que a multa é desproporcional. A defesa da KuCoin sustenta que seus controles internos e processos de conformidade evoluíram significativamente desde o período em análise, incluindo aprimoramentos nos procedimentos de conhecimento do cliente (KYC) e combate à lavagem de dinheiro (AML). A empresa enfatiza que restringiu voluntariamente seus serviços em jurisdições onde não possuía registro e licenciamento claros, buscando alinhar suas operações às regulamentações locais.
A ação fiscalizatória do FINTRAC menciona falhas em três áreas principais: registro, reporte de transações e reporte de transações suspeitas. A agência alegou que a KuCoin não se registrou como FMSB ao iniciar a oferta de serviços para residentes canadenses e que ignorou obrigações legais para identificar e reportar transações consideradas suspeitas. De acordo com a lei canadense, entidades reportantes devem apresentar um relatório de informações da entidade, reportar grandes transações em dinheiro e moeda virtual e registrar relatórios de transações suspeitas, inclusive aquelas vinculadas a operações ilícitas como mercados darknet ou pagamentos de ransomware.
O recurso da KuCoin apresenta fundamentos processuais e substanciais. Sob argumento processual, a exchange alega que o FINTRAC não forneceu aviso adequado sobre suas deficiências de conformidade nem oportunidade para correção antes da imposição da multa. Sob argumento substancial, a KuCoin questiona a metodologia utilizada para identificar as transações sujeitas a reporte, afirma que manteve diálogo com o FINTRAC sobre questões interpretativas e sustenta que quaisquer omissões no reporte foram não intencionais e já corrigidas.
O recurso sucede ações regulatórias e de fiscalização anteriores tomadas contra a KuCoin globalmente. Em janeiro de 2024, a KuCoin se declarou culpada em um tribunal federal dos EUA por operar um negócio de transferência de dinheiro sem licença e concordou em pagar quase US$ 300 milhões em multas e confiscos, incluindo multa criminal de US$ 112,9 milhões e confisco de US$ 184,5 milhões. Esse acordo exigiu da KuCoin a implementação de rigorosas medidas de conformidade e proibiu o atendimento a clientes dos EUA por pelo menos dois anos. Além disso, a exchange sediada nas Seychelles resolveu questões relacionadas com o Departamento de Justiça dos EUA e a Comissão de Comércio de Futuros de Commodities, destacando riscos regulatórios transfronteiriços contínuos para plataformas de ativos digitais.
Observadores do setor veem a ação canadense como parte de uma tendência mais ampla de fiscalização intensificada sobre provedores de serviços de criptomoedas. As autoridades canadenses sinalizaram uma aplicação mais rigorosa da Lei de Proceeds of Crime (Lavagem de Dinheiro) e Financiamento ao Terrorismo para alinhar-se aos padrões globais. A multa recorde imposta à KuCoin reforça a intenção do FINTRAC de dissuadir a não conformidade e aumentar a transparência no setor. Outras exchanges também enfrentaram ações no Canadá: a Shakepay, sediada em Vancouver, foi multada em C$3,5 milhões em 2023 por lapsos similares em relatórios AML.
A equipe jurídica da KuCoin argumenta que um recurso bem-sucedido poderia estabelecer um precedente importante para a classificação de plataformas internacionais de ativos digitais sob a lei canadense. O resultado pode influenciar as futuras expectativas regulatórias sobre registro, monitoramento e reporte de transações. Observadores apontam que, caso o tribunal mantenha a multa do FINTRAC, outras exchanges estrangeiras poderão enfrentar sanções semelhantes, a menos que obtenham antecipadamente o registro como FMSB e implementem controles AML aprimorados.
Para stakeholders e clientes, o recurso representa um teste crítico da abordagem do Canadá à supervisão das criptomoedas. À medida que os mercados de ativos digitais amadurecem, o equilíbrio entre inovação e conformidade permanece um desafio central de políticas públicas. A KuCoin comprometeu-se a manter suas operações durante o processo judicial, reafirmando seu compromisso com a segurança, proteção do usuário e colaboração regulatória. Espera-se que o Tribunal Federal agende uma audiência nos próximos meses, com uma decisão por escrito que poderá moldar o panorama regulatório para provedores de serviços de criptomoedas no Canadá e além.
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